16 julho 2005

Enter the Matrix

O mais atroz instrumento de tortura do Universo é o Vórtice de Perspectiva Total. Ele é tão terrível, tão horrívelmente mau, tão inconcebivelmente danoso que tem que ficar escondido em um planeta extremamente hostil e isolado, que apenas os seres merecedores de tal sina têm o desprivilégio de conhecer.
Seu funcionamento é simples, baseado na análise extrapolativa da matéria, onde, a partir de uma parte aleatória do cosmos, como um pedaço de pão-de-ló, por exemplo, toda a vastidão, todo o incomensurável tamanho e amplitude do Universo, bem como sua história desde o surgimento, suas civilizações, guerras, modismos, programas de tv, cada grão de areia de cada asteróide, é mostrado num só instante, somado a uma pequena seta vermelha indicando "Você está aqui". O infinito contraste entre o gigante Universo e a insignificante vítima quebra o espírito de qualquer ser vivente, que percebe que o mundo definitivamente não gira em torno de seu umbigo e, se não morre instantaneamente, fica irremediavelmente catatônico para o resto da vida.
A razão de ele ter sido inventado por alguém que queria irritar sua esposa não é importante para este post, mas é melhor explicada na fonte, o segundo livro da série O Guia do Mochileiro das Galáxias, O Restaurante no Fim do Universo, de Douglas Adams.
O primo pobre do Vórtice de Perspectiva Total foi lançado dias atrás pelo grande deus google e se chama Google Earth.
Lembra daquela animação no final de Men In Black, quando a câmera vai subindo, subindo, subindo, sai da Terra, do sistema solar, da galáxia, até mostrar o Universo dentro de uma bola de gude de um ET? É mais ou menos o que o Google Earth faz, com fotos de satélite da Terra inteira (INTEIRA!), sobre um esqueleto 3D, que pode ser movimentado, girado, ampliado e inclinado. O resultado é tão impressionante que dá pra ver desde uma região inteira, detalhes do relevo como o Everest e o Corcovado, até imagens bastante detalhadas das cidades maiores, como a USP ou a minha casa. Tente digitar o nome de absolutamente qualquer cidade do mundo (tipo Caparaó, Brazil), que ele acha. Em alguns lugares (leia-se EUA), dá pra achar qualquer endereço. Com um pouco mais de prática, dá pra descobrir bancos de dados adicionados por usuários com curiosidades como "John Lennon viveu aqui", ou "o lado mais fácil para escalar esta montanha". Dá também pra colocar a câmera no nível da rua e "passear" por Manhattan, por exemplo. Literalmente um mundo virtual.
O que mais me impressionou, entretanto, foi o fato de ter, pela primeira vez, uma noção real de perspectiva do tamanho das coisas. Ver a Terra distante se aproximando, definindo continentes, países, regiões, vendo florestas e rios, vendo a mancha cinzenta da cidade se transformar em pequenos prédios até chegar na própria casa é, no mínimo, revelador. Mostra, entre outras coisas, que (a) o mundo é grande, (b) nós somos pequenos, (c) tem lugar pra todo mundo e (d) viver em Diadema não é tão ruim assim, vocë podia ter nascido no deserto de Gobi.
O programa ainda tem muito pra progredir, como fazer o mundo inteiro (e não só as grandes cidades), em alta definição e ampliar a cobertura de endereços e estabelecimentos comerciais, mas isso é só questão de tempo. Will you take the Red Pill?

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